
A Cetesb autorizou a criação de um aterro sanitário em São Vicente, litoral paulista, mesmo após laudos técnicos confirmarem a presença de substâncias cancerígenas no solo. A empresa responsável pelo projeto, a PGV Terraplanagem e Resíduos, recebeu licença prévia sem precisar apresentar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA-Rima), como exige a legislação para empreendimentos de grande porte.
O laudo nº 355385/2024-0, encomendado pela Polícia Civil, revelou níveis elevados de arsênio, mercúrio, chumbo e benzo(a)pireno. Essas substâncias estão associadas a sérios riscos à saúde e podem contaminar o solo e as águas subterrâneas.
Ministério Público contesta decisão
O Ministério Público considerou a liberação do aterro uma grave violação ambiental. O órgão afirma que a licença simplificada dada pela Cetesb descumpre a Resolução Conama nº 01/1986, que exige análise aprofundada em áreas de risco. O parecer foi apresentado em uma ação popular movida pelo advogado Guilherme Craveiro, que pede a suspensão imediata da licença.
Segundo o MP, a área destinada ao aterro está próxima de manguezais e Áreas de Preservação Permanente (APPs). A presença de contaminantes exige, no mínimo, medidas de remediação, que foram ignoradas no processo.
Volume de resíduos é incompatível com licença simplificada
A justificativa da Cetesb para conceder a licença foi o enquadramento do projeto como “de porte insignificante”. No entanto, documentos revelam que a quantidade de resíduos planejada é vinte vezes maior do que o limite legal para esse tipo de enquadramento. Isso torna obrigatória a realização do EIA-Rima, dispensado de forma irregular.
Histórico de irregularidades da empresa
A PGV Terraplanagem já acumula multas e investigações por descarte irregular de resíduos e por operar aterros clandestinos. Em apenas três meses, a empresa movimentou mais de R$ 11 milhões, com transferências diretas para sócios, empresas parceiras e pessoas físicas ligadas à administração.
Os documentos financeiros também revelam saques em espécie de altos valores, o que levou o MP a recomendar o envio de informações ao COAF para investigar possíveis crimes de corrupção.
Denúncias e suspeitas de conluio
Em 2020, a PGV só foi multada após denúncias feitas à imprensa e imagens de satélite que comprovaram o descarte de lixo em área de recuperação florestal. Na época, vistorias presenciais da Cetesb não constataram irregularidades, o que levanta suspeitas de conluio entre fiscais e a empresa.
As investigações também envolvem supostos favorecimentos políticos. Um inquérito policial em andamento, acessado pela CBN Santos, apura a atuação de autoridades ligadas ao Deputado Estadual Tenente Coimbra (PL) no processo de licenciamento.
Retrocesso ambiental
Para especialistas, o caso representa um retrocesso nas políticas ambientais do estado de São Paulo. A decisão de simplificar processos mesmo diante de evidências graves de risco compromete não só o meio ambiente, mas também a saúde da população da Baixada Santista.
“Quando se flexibiliza a lei para favorecer empreendimentos poluentes, toda a sociedade paga o preço. Esse tipo de omissão não pode se repetir”, afirmou um ambientalista que acompanha o caso e pediu anonimato.