
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou, nesta quarta-feira (09), a aplicação de uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros. A medida deve entrar em vigor em quinta-feira (01) de agosto.
Em resposta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou que o Brasil é um país soberano. Além disso, citou a Lei de Reciprocidade Econômica como instrumento possível para reagir à medida americana. A norma autoriza o país a adotar contramedidas diante de retaliações comerciais externas.
O que é a Lei de Reciprocidade Econômica?
A chamada Lei nº 15.122, sancionada em abril deste ano, permite ao governo brasileiro reagir de forma proporcional quando for alvo de barreiras comerciais, legais ou políticas. Portanto, ela oferece respaldo jurídico para medidas de retaliação.
Na prática, funciona como um mecanismo de defesa econômica. Ou seja, quando um país impõe tarifas elevadas ou restrições contra o Brasil, a legislação permite respostas semelhantes.
As medidas previstas incluem:
- Sobretaxas em bens e serviços importados;
- Suspensão de cláusulas em acordos comerciais;
- Interrupção temporária de reconhecimento de patentes ou pagamento de royalties a empresas estrangeiras.
Além disso, todas essas medidas devem ser proporcionais ao dano causado, buscando proteger os interesses nacionais diante de práticas consideradas unilaterais ou abusivas.
A lei foi aprovada por unanimidade no Congresso Nacional e sancionada por Lula. Portanto, o país está legalmente preparado para reagir a ações como a anunciada por Trump.
Brasil pode responder, mas enfrenta limitações
Apesar do respaldo jurídico, economistas alertam que a força econômica brasileira é limitada para sustentar uma retaliação sem consequências internas. Por isso, a resposta precisa ser estratégica.
Produtos como café, aço, carne bovina e petróleo lideram as exportações brasileiras para os Estados Unidos. No entanto, o Brasil importa mais dos EUA do que exporta, o que desequilibra a balança.
“Os EUA ainda são nosso segundo maior parceiro comercial, mas vêm perdendo espaço nos últimos anos. Então, se houver retaliação, isso poderia afetar o crescimento econômico, inflação e os juros, que poderiam demorar mais a cair”, explica Sérgio Vale, economista da MB Associados.
Ele também avalia que os dois países serão impactados pela crise. “Dada a forma como Trump conduziu essa medida, com forte viés político, é difícil imaginar que o Brasil não vá reagir. E os EUA também vão sentir os efeitos: empresas americanas que importam café, aviões e outros produtos brasileiros devem pressionar o governo americano”.
Exportadoras brasileiras devem se reorganizar
Com a possível redução nas exportações para os Estados Unidos, empresas brasileiras precisarão buscar alternativas. Dessa forma, o setor produtivo pode ser forçado a reavaliar estratégias.
“Essas empresas vão ter que repensar se faz sentido um esforço tão grande de exportação para a economia americana, ou se faz mais sentido começar a procurar outros mercados”, destaca Sérgio Vale.
Para o economista Alfredo Trindade, apesar do respaldo jurídico, uma guerra comercial pode gerar mais prejuízos do que ganhos para o Brasil. Isso porque o país depende de insumos importados dos Estados Unidos, como máquinas, combustíveis e produtos químicos.
Além disso, ele alerta para a insegurança econômica. “Uma guerra comercial com os EUA pode custar caro, gerar inflação e desestimular investimentos. A saída mais inteligente é buscar soluções diplomáticas e multilaterais”.
Trump pode estar buscando barganha
Segundo Carla Beni, economista e professora da Fundação Getulio Vargas (FGV), Trump costuma adotar uma estratégia agressiva como forma de pressão. Isso sugere que ele esteja tentando forçar uma negociação.
Ela observa que a justificativa usada por Trump não se aplica ao Brasil. “O Trump disse que as tarifas que iria aplicar seriam para compensar a balança comercial contra os países em que há déficit. Isso não procede para o Brasil”.
Carla explica que o Brasil tem déficit comercial com os EUA, ou seja, importa mais do que exporta. Entre os principais produtos enviados aos americanos estão café, suco de laranja, petróleo e partes de aeronaves. Por outro lado, o Brasil compra iPhones, máquinas e equipamentos com alto valor agregado.
“Vai compensar para o Brasil sobretaxar em 50% esses produtos que entram aqui? Esse é o ponto”, questiona a professora.
Ela reforça que Trump já usou essa estratégia no passado. “Essa estratégia do Trump já é velha de guerra. Todo mundo sabe que ele atira para cima para deixar o outro lado estressado, e depois chama para conversar. Interessa para os EUA sobretaxar em 50% o café que o americano toma todo dia? Pois ele precisa do nosso café”.
Brasil pode buscar novos mercados
A economista acredita que o Brasil tem opções para redirecionar suas exportações. Portanto, mesmo com a tensão comercial, o país pode minimizar os prejuízos.
“Se a gente não for vender o café para os EUA, está cheio de outras opções para vender o nosso café”, completa Carla Beni.
Empregos não devem ser afetados de imediato
Apesar da incerteza, especialistas afirmam que não há razão para pânico no mercado de trabalho. Cada setor reagirá de forma diferente, e ajustes podem ser feitos.
“Não precisa imediatamente imaginar que vai ter demissão. Não tem nada que justifique ter demissão. Pelo contrário, a gente pode até ter um volume maior de produtos vendidos aqui dentro e quem sabe diminuindo o preço e aumentando a demanda”, afirma Carla Beni.
Sérgio Vale aponta que pode haver impacto pontual na indústria exportadora. No entanto, ele acredita que os efeitos serão graduais e sem grandes danos ao emprego.
“Minha impressão é que será um impacto diluído ao longo do tempo, sem provocar grandes alterações na taxa de desemprego ou no mercado de trabalho como um todo”.
Além disso, ele faz um alerta sobre o risco político envolvido. “Não dá para trabalhar achando que é algo momentâneo. Isso porque, Trump é muito ‘instável’ e com ele no poder pelos próximos quatro anos, não dá para contar com previsibilidade ou boa vontade”.