O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu no último domingo com o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, em uma tentativa de recompor a relação entre o Palácio do Planalto e o comando da Casa e destravar votações consideradas centrais para a agenda econômica na reta final do ano legislativo.
O encontro ocorreu após semanas de desgaste entre os dois, agravado pela decisão de Motta de escolher o deputado Guilherme Derrite, adversário do governo federal, como relator do projeto da Lei Antifacção. A escolha foi vista no Planalto como um gesto de afastamento político, sobretudo por Derrite ser aliado do governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas, apontado como possível concorrente de Lula nas eleições do próximo ano.
Também participou da reunião o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que vinha alertando o governo sobre o risco fiscal caso medidas consideradas estruturantes não fossem aprovadas ainda em dezembro. Segundo o ministro, a ausência dessas votações obrigaria a equipe econômica a promover um bloqueio expressivo de despesas logo no início de 2026 para cumprir a meta fiscal.
Durante a conversa, Lula expôs sua insatisfação com o distanciamento recente de Motta em votações sensíveis, como o projeto que trata da dosimetria das penas, a proposta de emenda constitucional da Segurança Pública e, principalmente, a Lei Antifacção. O presidente criticou diretamente a escolha do relator, enquanto Motta respondeu que a definição de relatorias é prerrogativa exclusiva da presidência da Câmara.
O diálogo ocorreu em um momento delicado para o chefe do Legislativo. Hugo Motta enfrenta instabilidade interna após a Câmara decidir não cassar os mandatos dos deputados Carla Zambelli e Glauber Braga. No caso de Braga, a reação negativa partiu sobretudo do Centrão, grupo que articulou a tentativa frustrada de cassação. O deputado Arthur Lira, principal liderança do bloco e responsável por viabilizar a eleição de Motta, chegou a classificar a situação da Casa como uma desorganização, em crítica pública ao sucessor.
Aliados do presidente Lula avaliam que a manutenção de um conflito aberto com o comando da Câmara tende a enfraquecer o governo, especialmente em um momento de necessidade de apoio parlamentar. Do outro lado, há a leitura de que Hugo Motta também precisa do respaldo do Planalto para recuperar autoridade política e reorganizar sua base na Casa.
Como resultado da reunião, Motta se comprometeu a colocar em votação ainda nesta semana uma série de projetos considerados prioritários pelo governo. Entre eles estão a etapa final da reforma tributária, a proposta que libera gastos em saúde e educação financiados com recursos do Fundo Social para os cálculos da meta fiscal e o projeto que prevê um corte linear nos gastos tributários.
As duas primeiras matérias começaram a ser analisadas pelo plenário da Câmara nesta segunda-feira. Já o projeto de redução dos benefícios tributários, com potencial de arrecadar cerca de R$ 21 bilhões, entrou na pauta desta terça-feira e, caso aprovado, ainda precisará passar pelo Senado para entrar em vigor no próximo ano.